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Reconvale Noticias | Especialista desmascara o uso político-partidário das megaoperações policiais no Rio





Em entrevista ao programa SBT Rio, a antropóloga e professora do Departamento de Segurança Pública da Universidade Federal Fluminense (UFF), Jacqueline Muniz, avaliou a megaoperação policial promovida na manhã desta terça-feira (28) no Rio de Janeiro, que, até agora, resultou na morte de 64 pessoas, quatro delas, agentes policiais.
Para ela, a ação do governo fluminense reflete “uma história antiga, com reprodução de vícios” e não cumpriu “os requisitos e os protocolos de operações policiais, segundo a doutrina policial da própria Polícia Militar e da Polícia Civil”.
Muniz destaca que as duas polícias desenvolveram protocolos de operações em 2018, por exigência do Ministério Público e cobrança da sociedade civil, e que, se tivessem sido seguidos, “o planejamento dessa operação teria sido melhor e os resultados não seriam essa lambança que nós assistimos”, ressaltando que a operação também contou com policiais mortos.
“Fuzis apreendidos não zeram, não precificam vidas”, pontua. “O que nós assistimos foi um uso político-partidário das operações, que têm servido como marketing publicitário, como campanha eleitoral.”
A professora da UFF também destacou a responsabilidade do governador Cláudio Castro (PL). “Eu queria lembrar um dado importante: o governante decidiu fazer uma operação sozinho. Então, eu estou pondo na conta do governador, porque eu ouvi a fala dele — uma fala irresponsável, que não foi clara quanto aos critérios dessa operação”, aponta.
Muniz observa ainda que, embora o governador tenha reclamado de falta de integração, ele “brincou do eu sozinho” na operação. “Ele integrou o Ministério Público? Não. A Defensoria foi acionada? Não. A Guarda Municipal foi acionada para ajudar no deslocamento do trânsito? Não. O Corpo de Bombeiros foi acionado para presteza de socorro diante do risco a que policiais estavam expostos, porque são generalistas e não especialistas em operações junto com a população? Não.”
“Qual foi o recurso que ele [Castro] mobilizou? O bloco do ‘eu sozinho’. E fica, evidentemente, cobrando do governo federal que, por sua vez, em vez de apresentar uma política integrada de segurança, que se pode fazer agora, fica adiando a discussão, colocando que é tudo por conta da PEC”, diz.
Outro ponto ressaltado por Muniz é o impacto de se deslocar tamanho efetivo para uma área da cidade. “Para começar, 2.500 policiais, quando empregados numa operação de larga escala como essa, significam a retirada de policiamento de 3 milhões a 5 milhões de pessoas na região metropolitana. Razão pela qual foi muito fácil para criminosos fazerem represálias nas vias principais da cidade do Rio de Janeiro”, explica.
Sensação de insegurança
Operações como esta não conseguem proporcionar o que seria essencial: segurança. “Se você inviabiliza ônibus, inviabiliza a circulação de mercadorias, inviabiliza que as pessoas vão para o trabalho, voltem do trabalho, vão para a universidade ou mesmo a tia que ia dar aula, as aulas foram canceladas, que os sujeitos possam usar os serviços essenciais, o que mesmo você está produzindo?”, questiona.
“Segurança é garantir rotina, previsibilidade, regularidade. Segurança é abundância de futuro. Então, o que nós assistimos foi um uso eleitoreiro dos recursos policiais, que são incapazes de serem sustentados”, critica. “O efeito repressivo de uma operação que é de alto custo e de curto prazo, provisório e pontual no tempo e no espaço. Para que o efeito dessa repressão dure no tempo, é preciso os demais recursos de polícia.”
Além disso, ações policiais que resultam em mortes questionáveis, do ponto de vista da legalidade e dos direitos humanos, comprometem a inteligência e a investigação do trabalho policial, pois perde-se o acesso a quem poderia “dar a informação de como funciona, na esquina, o crime organizado; como aquela drogaria ilegal funciona; a participação de políticos e empresários; os mecanismos de lavagem de dinheiro; e a entrada e saída de drogas que não chegam com cegonha”.
“Quando se mata o suposto criminoso, você está sabotando por dentro o trabalho de investigação de inteligência, prestando um serviço ao crime organizado, porque a mão de obra morta é uma mão de obra barata, substituível, que ganha mal, não tem seguro de vida, é precarizada”, pontua Muniz.

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