O ministro Flávio Dino, do STF (Supremo Tribunal Federal), afirmou nesta quarta-feira (29) que a corte não julga contra ou a favor as polícias em casos envolvendo as forças de segurança. Ao mesmo tempo, disse que a atuação delas deve ser legítima e proporcional.
Mais à frente no debate, ele afirmou que casos como o do Rio de Janeiro demonstram a necessidade de se pensar uma teoria da ação policial. Dino disse também que o registro de cadáveres na mata não é Estado de direito.
Os comentários foram feitos na sessão do plenário no início do julgamento em um caso sobre a responsabilidade do Estado por danos causados pela força estatal em manifestações. Da tribuna, um advogado afirmou que "o Brasil acordou de luto pelas mortes de policiais e de civis no Rio de Janeiro".
"Não se trata jamais de julgar a favor ou contra as polícias como instituição. Como qualquer atividade humana, com certeza há bons e maus profissionais na polícia, bem como no sistema de Justiça. E, às vezes, há uma ideia de que quando há um julgamento dessa natureza, há uma tentativa de impedir a ação da polícia. Ao contrário", disse o ministro.
Dino é relator do recurso em julgamento que trata de atos de policiais militares na Operação Centro Cívico, em 2015, no Paraná, num protesto de servidores estaduais, a maior parte deles, professores. A ação resultou em 213 pessoas feridas.
No Rio, moradores do Complexo da Penha, na zona norte da cidade, levaram na madrugada desta quarta ao menos 70 corpos para a praça São Lucas, na comunidade. Eles foram localizados na mata entre os complexos do Alemão e da Penha
"Esses eventos todos, essas tragédias todas, se prestam a mostrar como nós precisamos cuidar de uma teoria geral da ação policial, sobretudo no plano político, e procurar solucionar os casos concretos, mostrando uma posição institucional nossa, que não é nem de impedir a ação da polícia, nunca fui. Mas ao mesmo tempo não é de legitimar um vale tudo com corpos estendidos e jogados no meio da mata, jogados no chão. Isso não é Estado de direito", disse.
O ministro lembrou que já chefiou forças de segurança nos cargos que ocupou no Executivo e acrescentou que casos como este como este servem também como uma mensagem.
"Não se trata de um julgamento abstrato, apriorístico, se a polícia age bem ou mal. Nesse terreno na segurança pública se grassam os discursos fáceis, quando bem sabemos que as respostas estão em outro território", disse.
Dino também afirmou que as polícias têm o monopólio do uso da força, mas que esse uso deve ser proporcional.
"Lembremos de [Max] Weber e o monopólio legítimo da força. Mas ele acentuava a palavra legítimo. Limitado. E na ótica de Weber a limitação era dada pela lei, no Estado democrático de direito. Se traduz de que a lei seja cumprida para que seja legítimo; e Weber chamava a atenção também para a importância do governante a cada momento, inclusive nesses momentos, de aquilatar as consequências de tal atitude", afirmou.
A ação policial desta terça-feira (28) deixou ao menos 119 pessoas mortas, segundo o governo local. A ação nos complexos do Alemão e da Penha, na zona norte do Rio de Janeiro, foi a mais letal do país envolvendo policiais, segundo a diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Samira Bueno.
A operação e a resposta do Comando Vermelho —que usou armamento pesado e ordenou o fechamento de vias— deixou diversas regiões da segunda maior cidade do país com um cenário de guerra, com caos nas ruas, tiroteios e veículos queimados.
0 Comentários