No quintal de casa em meio a árvores, flores e plantas, Sebastião Gomes, de 54 anos, descansa sentado debaixo de uma sombra. Homem de fé, tem em mãos a Bíblia, sua companheira desde a infância. O clima é de paz junto à seus bichinhos de estimação – três cachorros e dois gatos. Sebastião não os ignora e trata todos como se fossem filhos. Quem o vê sereno dessa forma nem imagina que há sete dias ele correu o risco de morte. Ele é um dos sobreviventes do crime ambiental que ocorreu última sexta-feira na Barragem Mina Córrego do Feijão. Casado e pai de três filhos, ele mora no Bairro Jardim das Alterosas, em Betim, na Grande BH, há mais de 20 anos e trabalha na Vale há nove.
Ele estava no momento em que a barragem se rompeu, mas foi salvo do mar de lama que devastou o refeitório da empresa, área administrativa, além de uma pousada localizada próximo ao local. “Agora eu tenho duas datas de nascimento, uma em 22 de julho, e outra 25 de janeiro”, desabafou Sebastião, em entrevista ao jornal Estado de Minas.
Era um dia normal, quando ele e o amigo Elias de Jesus Nunes terminaram de almoçar e saíram do refeitório às 11h20. Eles pegaram a caminhonete e subiram para continuar o serviço. Foi nesse momento que escutaram um forte barulho. “Só escutamos um estrondo, que não tem como explicar a força. Foi muito violento. Quando olhamos para o lado vimos muita lama. Só deu tempo de correr para caminhonete. Estava procurando por um abrigo com medo de entrar no carro. Mas o Elias me disse: 'não Sebastião, entra na caminhonete, se não você vai morrer'. Só deu tempo de entrar no veículo. Tratores descendo, ferro distorcido por todo lado, e em frente se via um raio enorme de rejeitos. Nesse momento começamos a rezar o Pai nossomuito alto.”
Sebastião e Elias não sabiam direito o que estava acontecendo. Foi então que perceberam que a barragem havia rompido. Elias virou e disse: “Sebastião, não tem jeito.” Logo depois, seu colega soltou o volante e a onda de lama envolveu o veículo. “Ficamos à deriva. A lama levou a gente para lá e para cá. De repente, houve um silêncio, tudo parou. E nossa caminhonete, ali virada dentro da lama, olhei para os lados e vi seu Antônio, motorista de um dos caminhões que conseguiu sair com vida”, disse.
Eles ficaram parados dentro da caminhonete, não tinha entendido o porquê de o veículo ter parado. Depois pôde verificar que os vagões que desciam pela onda de lama fizeram uma espécie de barreira entre o carro e o tsunami de rejeitos de minério, isso impediu que algo mais grave pudesse ocorrer com eles. Para Sebastião, o que os salvou foi 'a mão de Deus'. “Veio um silêncio, parece que a natureza calou. A gente era acostumado a ouvir passarinhos, mas naquele momento não havia nada para se ouvir”, explicou.
Quando conseguiram sair do carro, começaram a procurar outros sobreviventes e se depararam com um rapaz preso em um trator todo coberto de lama. No desespero, os dois amigos, junto com Antônio, começaram a escavar com as mãos a lama dentro do trator na tentativa de salvar a vida do homem identificado apenas como Leandro. “Nós tiramos ele e entramos em desespero, pois nós precisávamos de socorro”, revelou Sebastião.
SOCORRO O primeiro helicóptero a chegar no local foi o de uma TV. Quando Sebastião avistou a aeronave, começou a fazer sinais pedindo por socorro. Foi então que ele pegou seu celular sujo de lama e pediu que os bombeiros fossem ao seu auxílio. “Tentei ligar para minha filha. Ela já estava na sala vendo tudo, e minha esposa, que toma remédio antidepressivo, estava desesperada e chorando muito. Consegui falar com minha filha, que pediu socorro. ‘Dei sua referência pai, os bombeiros já estão indo aí’.”
Depois do resgate, os sobrevivente foram conduzidos para a Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) de Sarzedo, também na Grande BH. “Estou muito triste por ter perdido vários amigos soterrados, mas, ao mesmo tempo, estou feliz porque estou vivo. Agradeço a Deus.”
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