Você marcou um exame pelo SUS e, depois de semanas esperando, decide ver quando será atendido. A resposta? Nenhuma. Ninguém sabe. Não há lista, nem previsão. Assim, o cidadão fica sem informação e sem saber se sua vez realmente vai chegar ou se alguém com “influência” passou na frente.
Essa pode ser a nova realidade de São Miguel das Matas. A Prefeitura, com o apoio dos vereadores da situação, acabou de vez com a Lei da Transparência nas Filas da Saúde, que obrigava a divulgação da ordem de atendimento de consultas, exames e cirurgias. Os vereadores da base do prefeito aprovaram essa revogação, acabando com uma ferramenta que dava ao povo o direito de acompanhar as filas do SUS e cobrar justiça no atendimento.
Imagine uma senhora idosa, de baixa renda, esperando há meses por uma ressonância. Ao mesmo tempo, um jovem com boas condições financeiras e relacionamento próximo à gestão consegue o exame em questão de dias. Ninguém saberá o motivo, porque a lista pública, que mostrava a ordem cronológica de espera, deixou de existir.
Revogar a lei de transparência concentra poder em poucos e transforma a saúde em moeda de troca política, um retrocesso que põe o cidadão à mercê da boa vontade de quem está na gestão.
A lei foi criada em 2021 e representava um avanço importante, mas nunca chegou a funcionar bem. A Prefeitura não atualizava as listas como deveria, e o cidadão continuava sem acesso à sua posição na fila. Mesmo assim, em vez de corrigir o problema e fazer a lei valer de verdade, a gestão municipal preferiu acabar com ela, com o aval dos vereadores aliados.
A justificativa usada foi que a divulgação das listas feria a privacidade dos pacientes e contrariava a Lei Geral de Proteção de Dados. Mas isso não é verdade. A Justiça já confirmou que a lei é legal e não expõe ninguém, pois não mostra nomes nem dados pessoais.
A decisão de revogar a lei veio justamente depois que a Justiça mandou que a Prefeitura atualizasse as listas em 30 dias, sob pena de multa. Coincidência? Difícil acreditar.
Transparência não é luxo, é dever. Sem ela, a saúde corre o risco de virar um jogo de favorecimento e política. Quem tem influência se dá bem; quem mais precisa fica esperando.
Revogar essa lei é escolher o segredo no lugar da clareza, e o privilégio no lugar da igualdade. É um passo para trás na saúde pública e um desrespeito com quem mais depende do SUS.
Por Advogado Reinaldo Lemos

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